O arrebatamento e as crianças: Elas também serão levadas?


O arrebatamento da Igreja é um dos temas mais esperados, debatidos e, ao mesmo tempo, cercado de dúvidas no meio cristão. Entre elas, uma das mais sensíveis é esta: as crianças também serão arrebatadas? Diante de tantas vozes, especulações e posicionamentos, é necessário buscar clareza nas Escrituras, lucidez na teologia e sensibilidade pastoral para abordar este assunto.

A Pureza Infantil nas Palavras de Cristo

Jesus não nos deixou no escuro quando se trata do valor espiritual das crianças. Em Mateus 18.3, Ele declarou:

“Em verdade vos digo que, se não vos converterdes e não vos fizerdes como crianças, de modo algum entrareis no Reino dos Céus.”

Essa afirmação não apenas exalta a humildade e a pureza das crianças, mas também coloca nelas um modelo de comportamento para os adultos. Em outro momento, Cristo disse:

“Deixai os pequeninos, e não os estorveis de vir a mim, porque dos tais é o Reino dos Céus” (Mateus 19.14).

Não há dúvida de que Jesus via nas crianças um símbolo de fé, inocência e dependência. Isso nos aponta para uma verdade espiritual: há uma proteção divina especial sobre os pequenos, que ainda não alcançaram a plena consciência moral do pecado.

A Idade da Responsabilidade

Muitos teólogos, como Wayne Grudem (em sua Teologia Sistemática), defendem o conceito da “idade da responsabilidade” (ou “idade da razão”), sugerindo que Deus não imputa culpa plena a uma criança que ainda não tem capacidade de compreender o Evangelho. Norman Geisler, em sua obra Teologia Sistemática – Volume 3, reforça que o juízo de Deus se dá com base no conhecimento e consciência do pecado. Ele escreve:

“Deus julga segundo a luz que cada um recebeu. Crianças pequenas que morrem antes de alcançar a responsabilidade moral, estão sob a misericórdia divina, e não sob condenação.”

Essa compreensão é sustentada por textos como Romanos 7.9, onde Paulo diz:

“Porque eu, sem a lei, vivia outrora; mas, vindo o mandamento, reviveu o pecado, e eu morri.”

A passagem sugere que existe um momento de “consciência espiritual”, em que o ser humano passa a entender o bem e o mal diante de Deus. Antes disso, vive em uma espécie de “estado de graça”, não por mérito, mas por misericórdia.

Exemplos Bíblicos de Julgamento Coletivo

É aqui que muitos argumentam com base no Antigo Testamento: e quanto ao dilúvio? E quanto a Sodoma e Gomorra? As crianças não morreram também? Sim, é verdade. Em Gênesis 6–9, no dilúvio, e em Gênesis 19, na destruição de Sodoma, os juízos de Deus foram coletivos, e certamente incluíram crianças, idosos e gestantes.

Contudo, esses episódios são juízos físicos e temporais, sobre a carne, e não eternos sobre a alma. Não podemos afirmar, com base nesses textos, que aquelas crianças foram condenadas espiritualmente. O juízo final, segundo Romanos 14.12, será individual:

“Assim, pois, cada um de nós dará conta de si mesmo a Deus.”

O Arrebatamento e os Pequenos

Em 1 Tessalonicenses 4.16-17, Paulo descreve com esperança o arrebatamento:

“…os mortos em Cristo ressuscitarão primeiro. Depois nós, os que estivermos vivos, seremos arrebatados juntamente com eles nas nuvens…”

Embora o texto não mencione diretamente as crianças, muitos estudiosos creem que elas estão incluídas neste evento, com base no caráter de Deus e nas palavras de Cristo.

O teólogo Tim LaHaye, autor da série Deixados para Trás e especialista em escatologia pré-tribulacionista, defende que todas as crianças que ainda não atingiram a idade da responsabilidade serão arrebatadas. Segundo ele:

“A misericórdia de Deus abrange os que ainda não puderam decidir conscientemente por Cristo. O arrebatamento será uma grande colheita de inocentes.”

Ouro renomado intérprete, Charles Ryrie, afirma:

“A salvação é um ato da graça. E se há um grupo que representa bem essa dependência da graça, são as crianças pequenas que ainda não têm consciência de pecado.”

Interpretações Escatológicas ao Longo da História

Historicamente, a Igreja cristã sempre teve diferentes posições escatológicas. O pré-tribulacionismo (que defende que a Igreja será arrebatada antes da grande tribulação) é a visão mais comum entre os evangélicos pentecostais e muitos batistas. Essa linha teológica entende que o arrebatamento inclui todos os salvos, e nesse entendimento, as crianças que ainda não têm responsabilidade moral estão entre os que serão levados.

A linha reformada, em muitos casos, entende que os filhos dos crentes são santificados pela fé dos pais (1 Coríntios 7.14), o que também reforça a ideia de que os filhos dos salvos, mesmo pequenos, estão debaixo de uma aliança espiritual.

O Deus da Graça e da Justiça

Se há algo que aprendemos na Bíblia, é que Deus é infinitamente justo, mas também misericordioso. Ele não condena inocentes, nem trata as crianças como trata os ímpios conscientes. Tiago 2.13 diz que “a misericórdia triunfa sobre o juízo”. E o profeta Jeremias já reconhecia em Lamentações 3.22-23:

“As misericórdias do Senhor são a causa de não sermos consumidos.”

Confiamos que o mesmo Deus que ama, guarda e recebe as crianças hoje, também agirá com justiça e compaixão no dia do arrebatamento.

Conclusão Pastoral

Como pastor, tenho sido procurado por pais angustiados: “Pastor, e meus filhos pequenos? Se Jesus voltar agora, eles irão comigo?” E com o coração firmado na Palavra, posso afirmar: Sim, irão! Porque eles pertencem à graça do Senhor, são preciosos aos olhos do Pai, e o Reino dos céus já lhes pertence.

O arrebatamento não é um tema para gerar medo, mas esperança. E essa esperança se estende não só aos adultos que creram em Jesus, mas também aos pequeninos que ainda não puderam crer, mas já são cuidados e guardados pelo amor do Salvador.

Essa é nossa esperança viva. E que sejamos vigilantes, atentos e fiéis — preparando nossas casas para a volta do Rei, ensinando nossos filhos no caminho, e descansando na promessa de que Ele não se esquecerá dos que ainda nem aprenderam a dizer “Amém”, mas já pertencem ao coração dEle.

Pastor Luciano Gomes, Teólogo.

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