
Entre os muitos temas que o apóstolo Paulo aborda nas suas cartas, poucos são tão debatidos quanto o dom de línguas. Em 1 Coríntios 14:14, ele declara:
“Porque, se eu orar em língua, o meu espírito ora de fato, mas a minha mente fica infrutífera.”
Essa afirmação pode parecer, à primeira vista, confusa para alguns. Afinal, o que significa o “espírito” orar enquanto a mente não participa? E por que Paulo insiste tanto na importância da interpretação das línguas? Vamos entender o contexto e a profundidade dessa declaração.
O contexto das cartas aos Coríntios
As igrejas de Corinto eram marcadas por uma grande manifestação dos dons espirituais (1Co 1:7), mas também por confusões sobre como usá-los. Paulo dedica os capítulos 12, 13 e 14 de 1 Coríntios para ensinar:
O propósito dos dons.
A ordem e a decência no culto.
A supremacia do amor como motivação.
No capítulo 14, ele entra especificamente no dom de línguas e no dom de profecia, mostrando que, sem interpretação, o falar em línguas não edifica a comunidade.“Meu espírito ora, mas minha mente fica infrutífera”
Paulo distingue duas partes da experiência humana:
O espírito humano: nossa parte mais íntima, que se conecta com Deus, recebendo inspiração direta do Espírito Santo.
A mente: a capacidade racional, que organiza e entende as palavras.
Quando alguém ora em línguas, segundo Paulo:
Não está produzindo frases compreendidas pelo intelecto.
O conteúdo da oração é um “mistério” (1Co 14:2), entendido somente por Deus.
A oração é real e eficaz, mas não é acompanhada pela compreensão mental.O papel do Espírito Santo
É importante entender que não é o Espírito Santo “falando sozinho” no lugar da pessoa. Paulo diz “meu espírito ora” — ou seja, é a própria pessoa, em seu espírito, que ora, mas sob a influência e capacitação do Espírito Santo.
Há, portanto, uma parceria:
O Espírito Santo concede a língua e direciona a oração.
O espírito humano expressa essa oração.
A mente fica “de fora” do conteúdo, pois não entende as palavras.A importância da interpretação
Paulo não despreza o dom de línguas, mas lembra que, no culto público, ele precisa de interpretação (1Co 14:27-28). Sem interpretação:
A edificação é apenas individual.
A igreja não recebe instrução, exortação ou consolo.
O dom não cumpre sua função comunitária.
Por isso ele conclui:
“Eu quero que todos vocês falem em línguas, mas muito mais que profetizem; pois quem profetiza é maior do que aquele que fala em línguas, a não ser que as interprete, para que a igreja receba edificação” (1Co 14:5).Aplicações práticas para a igreja
No devocional pessoal: orar em línguas pode ser uma poderosa forma de comunhão com Deus, mesmo que a mente não entenda.
No culto público: deve-se buscar interpretação para que todos sejam edificados.
Equilíbrio: os dons não são para ostentação, mas para serviço; não para confundir, mas para edificar.
Conclusão
O ensino de Paulo nos mostra que o falar em línguas é uma expressão profunda do nosso espírito diante de Deus, mas não substitui a necessidade de comunicar a verdade de forma compreensível à igreja. A espiritualidade genuína não anula a razão; ela a complementa.
O dom é uma bênção, mas o propósito é sempre edificar o Corpo de Cristo.
Por Pastor Luciano Gomes, teólogo e colunista do portal
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