Por que os judeus ortodoxos não creem que Jesus é o Messias?

A esperança de um rei terreno, a rejeição do Cristo crucificado e o véu que ainda cobre os olhos de Israel
Uma das questões mais intrigantes para muitos cristãos é entender por que os judeus, especialmente os ortodoxos, ainda não reconhecem Jesus como o Messias prometido. Como pode o povo ao qual foram confiadas as promessas, as alianças e a própria linhagem do Salvador (Romanos 9:4-5), ainda esperar por um Messias que, segundo o cristianismo, já veio há mais de dois mil anos?

Neste artigo, vamos compreender quem são os judeus ortodoxos, qual é a expectativa messiânica dentro dessa corrente do judaísmo e por que muitos rejeitam Jesus Cristo como o Messias. Também faremos uma análise do texto de João 1:11-12 e traremos o olhar de teólogos cristãos e rabinos judeus sobre esse tema tão profundo.

Quem são os judeus ortodoxos?

Os judeus ortodoxos representam o segmento mais tradicional e rigoroso do judaísmo contemporâneo. A palavra ortodoxo vem do grego orthos (correto) e doxa (doutrina), e significa “doutrina correta”. Para eles, a Torá (Lei de Moisés), o Talmude e as tradições rabínicas orais têm autoridade suprema, e sua vida é inteiramente moldada por essas normas. Vestem-se de forma distinta, seguem rígidos rituais e observam fielmente os mandamentos.

Diferente dos judeus reformistas ou seculares, os ortodoxos aguardam um Messias real, terreno, descendente de Davi, que restaurará o trono em Jerusalém, reconstruirá o Templo, reunirá os exilados de Israel e trará paz universal.

Por que eles rejeitam Jesus como o Messias?Expectativa de um Messias político e reinante

As profecias messiânicas do Antigo Testamento, como Isaías 11, Jeremias 23 e Ezequiel 37, apontam para um Messias que trará paz, justiça e restaurará o Reino de Israel. Para os judeus ortodoxos, Jesus não cumpriu essas promessas — ao contrário, foi rejeitado, humilhado e morto na cruz, o que, segundo eles, invalida sua messianidade.

O rabino Maimônides (Rambam), uma das maiores autoridades judaicas, escreveu nos seus Treze Princípios da Fé que o Messias:

Deve ser descendente de Davi;

Deve reconstruir o Templo de Jerusalém;
Deve reunir os exilados de Israel;
Deve trazer paz e fazer com que todos os povos sigam a Torá.
Como Jesus não realizou essas ações de forma visível em sua primeira vinda, os judeus ortodoxos consideram que ele não pode ser o Messias.A cruz como escândalo
Para o pensamento judaico tradicional, a morte de Jesus foi um escândalo. A crucificação era vista como símbolo de maldição, conforme Deuteronômio 21:23:

“Maldito todo aquele que for pendurado no madeiro”.

O apóstolo Paulo reconheceu essa dificuldade ao dizer:

“Nós pregamos a Cristo crucificado, escândalo para os judeus e loucura para os gentios” (1 Coríntios 1:23).

O teólogo John Stott, em A Cruz de Cristo, explica que os judeus esperavam um Salvador vitorioso, não um sofredor humilhado. Por isso, muitos não aceitaram a mensagem da cruz.A cegueira espiritual anunciada nas Escrituras

O apóstolo Paulo, judeu de nascimento e fariseu por formação, escreveu com pesar em Romanos 11:25:

“… o endurecimento veio em parte sobre Israel, até que a plenitude dos gentios haja entrado.”

Ou seja, há um véu espiritual que cobre o entendimento de muitos judeus, como também afirma 2 Coríntios 3:15-16:

“…quando Moisés é lido, o véu está posto sobre o coração deles. Mas, quando se converterem ao Senhor, o véu será tirado.”

A análise de João 1:11-12

“Veio para o que era seu, e os seus não o receberam. Mas, a todos quantos o receberam, deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus, aos que creem no seu nome.”

Este trecho é uma declaração do apóstolo João, não uma fala direta de Jesus. O versículo expressa a dor do fato de que o Messias veio primeiro ao seu próprio povo — Israel — mas foi rejeitado. Ao mesmo tempo, revela a graça de Deus: todos os que creem em Jesus, sejam judeus ou gentios, tornam-se filhos de Deus.

Essa rejeição não foi total. Muitos judeus creram em Jesus — os apóstolos, inclusive João, eram judeus. Mas, no geral, a liderança religiosa e grande parte do povo recusaram-no por não se encaixar na imagem de Messias que esperavam.

O que dizem rabinos contemporâneos?

Rabino Tovia Singer, do Outreach Judaism, afirma que o cristianismo distorceu as profecias do Antigo Testamento para encaixá-las em Jesus.

Rabino Menachem Mendel Schneerson, líder do movimento Chabad, ensinava que o Messias ainda virá, e será claramente reconhecido por todos.

Rabino Shmuley Boteach, em seus debates públicos, argumenta que o cristianismo espiritualizou demais as promessas messiânicas.

Por outro lado, estudiosos judeus messiânicos como Dr. Michael Brown afirmam que os judeus se esqueceram de que a vinda do Messias era dupla: primeiro como Cordeiro, depois como Leão. Ele diz:

“O que os judeus ortodoxos esperam para o futuro, os cristãos reconhecem que já começou com a primeira vinda de Jesus e será completado em sua segunda vinda.” (Answering Jewish Objections to Jesus, Vol. 1)

Conclusão pastoral

A rejeição de Jesus como Messias por parte dos judeus ortodoxos não se dá por ignorância, mas por uma leitura distinta das Escrituras e pela manutenção fiel de uma tradição milenar. No entanto, o plano de Deus para Israel não terminou. A Bíblia nos garante que haverá um tempo de restauração:

“E assim todo o Israel será salvo…” (Romanos 11:26)

É nosso papel como Igreja continuar orando, evangelizando e amando o povo judeu. Devemos lembrar que foi deles que veio a salvação (João 4:22), e que Deus os ama com amor eterno. Um dia, muitos reconhecerão que Yeshua Hamashiach (Jesus, o Messias) veio, morreu, ressuscitou e voltará em glória.

“E olharão para mim, a quem traspassaram; e o prantearão como quem pranteia por um unigênito” (Zacarias 12:10)

Pastor Luciano Gomes,
teólogo e colunista do portal Veja Aqui Agora
e do blog Crescimento Espiritual.

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